quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Memorial de leitura - Ana Paula

                                                                       
Minha trajetória literária iniciou-se aos 5 anos de idade. Meu pai, um homem analfabeto e que só assinava o próprio nome, sempre me presenteava com livros. Era costume de ele colocar um livro ao lado de minha cabeça enquanto eu dormia, então quando eu acordava, já me deparava com o presente. Aquele cheiro das folhas novinhas do livro me fazia tão bem, e mesmo sem conseguir ler as palavras eu já me encantava com as imagens e com aquele aroma especialmente agradável para mim. Eu guardava meus presentes, os livros, na minha caixinha de brinquedos, eles ficavam dentro de sacos plásticos para não se misturar. Eu amava as histórias de Rei Rolo (meu pai conseguiu me dá parte dessa coleção), elas tinham poucas palavras e bastantes figuras seqüenciadas. Quando aprendi ler, meu pai ficou muito feliz, e passou a me trazer revistas de adultos do tipo Casa Claudia e foto novelas. Na época eu achava aquele tipo de literatura meio complicada de ler porque tinha palavras muito difíceis e que eu não sabia o que significavam, mas eu gostava mesmo assim. Um dia eu li num livro que ele me trouxe a palavra “essencial” e eu achei ela linda, adorava escrevê-la, depois fui vendo ela escrita em outros lugares e fui entendendo o seu significado, também fui percebendo  a maneira de escrever muitas outras palavras e eu me orgulhei muito no dia em que consegui ler a palavra “shampoo” e a palavra “shorts” sem ajuda de ninguém. Quando meu pai passou a me dar gibis, nasceu em mim o gosto pelo desenho. Eu amava desenhar os personagens da turma da Mônica e quando fiz 10 anos, comecei a criar meus próprios personagens de historinha, fiz parte de uma exposição de desenho e de quadrinhos que houve na escola na época e apareci até na televisão. Minha família ficou muito feliz com isso. Na adolescência a curiosidade comum dessa fase me movia para as revistas capricho, e qualquer artigo que falasse de namoro, virgindade, sexo e astrologia. Também vivenciei o momento dos contos românticos como “Sabrina” que me empolgavam muito. Quando namorei um rapaz militante do partido dos trabalhadores passei ler artigos sobre sistema capitalista, ideologia, utopia, socialismo e algumas coisas sobre Carl Marx, também passei a me interessar por MPB e músicas dos anos 70, foi nessa época que passei a escrever meus pensamentos em diários, agendas ou cadernos que eu enfeitava com várias fotos e coisas que achava legais. O namoro acabou mas o gosto por esse tipo de literatura não, ficou esporádico porque as pessoas com quem me relacionava agora tinham outra maneira de ver o mundo, mas sei que foi depois daqueles textos que eu passei a ser uma pessoa crítica. Nessa época eu tinha uma vizinha que não sabia ler, mas morria de vontade de aprender então eu decidi ensiná-la e ia á noite todos os dias a casa dela para alfabetizá-la. Ela conseguiu aprender escrever o próprio nome e depois foi alfabetizada, eu gostei muito daquela experiência, era muito bom fazer aquilo. Depois dessa fase eu me converti ao evangelho junto com meu irmão, e passei a ler artigos religiosos, e literatura evangélica, além da Bíblia. Eu me informava para falar de minha fé para outras pessoas. Também escrevia textos e falava em público sobre assuntos relevantes para aquele grupo social. No início do ano de 2000 eu fui estudar magistério, então, passei a ler a revista Nova Escola e outros artigos voltados para educação. Depois que terminei o magistério, me inscrevi para participar como professora no Projeto Brasil Alfabetizado do Governo Federal, e em uma das formações conheci algumas obras de Augusto Cury, o qual leio até hoje, e o não menos conhecido Paulo Freire com a sua Pedagogia da autonomia e Pedagogia do oprimido, a leitura nestes escritos me reportou as leituras que fazia na época de meu namorado militante do partido dos trabalhadores e me identifiquei especialmente com Freire por conta disso. A partir daí, passei a ser assinante da revista Nova Escola, e ler artigos sobre educação na internet, consegui colocar o projeto de alfabetização de jovens e adultos na igreja em que eu freqüentava e passei alfabetizar os membros da igreja que não sabiam ler e outras pessoas do bairro também. Depois de quatro anos, mudei de bairro e fui morar perto de onde trabalhava, uma escola de educação infantil, então passei a ler textos sobre ludicidade e alfabetização de crianças pequenas. Conheci mais de perto as teorias de Piaget e as teorias de Vygotsk. Também me aproximei mais de Emília Ferreiro e do próprio Freire (que não deixo nunca) para validar minha ação diária. Atualmente minha relação com a literatura tem sido os teóricos do curso de pedagogia, literatura infantil por conta de meus alunos e literatura afro por conta das formações continuadas da rede em que trabalho. Não tenho lido para meu prazer, digo, literaturas mais extensas do tipo livros, romances e etc. Muito embora toda literatura supracitada não chega ser nenhum sacrifício. A última leitura prazerosa que fiz já tem dois anos, foi um livro de Augusto Cury com o título de inteligência multifocal. A leitura sempre esteve presente em minha vida, e apesar de meus pais não terem tido acesso a ela, sempre fizeram o possível para que eu pudesse ter livros a minha disposição. Eu quase esquecia de falar, mas minha mãe foi uma de minhas alunas no projeto de alfabetização de jovens e adultos e hoje ela é alfabetizada, meu pai não se interessou em participar das aulas, segundo ele, não precisava aprender mais nada, e mesmo sem querer aceitar respeitei a decisão dele. Entendo que foi a leitura que contribuiu ricamente para formação de minha personalidade, aliada a atitude de meu pai que me ensinou mesmo sem saber ler, uma das lições mais importantes de minha vida, a possibilidade de proporcionar às pessoas a oportunidade se conhecer, conhecer o mundo e se expressar nele através da leitura. Foi exatamente isso que ele fez comigo, mesmo sem saber que estava fazendo.

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